INTRODUÇÃO
Sob diversas óticas, o Afeganistão é resultado de sua localização geográfica e de sua topografia. Ele já foi chamado de "encruzilhada da Ásia Central" porque a lendária Passagem Khyber, localizada na fronteira oriental com o Paquistão, é um ponto estratégico de ligação entre a Índia e regiões a oeste dali. Muitos imperadores mundiais invadiram o Afeganistão com o objetivo de dominar essa passagem, mas a maioria fracassou. A principal razão para o fracasso das invasões reside no fato de que o país é, literalmente, cortado ao meio pela Cordilheira do Hindu Kush, que além de formar um esconderijo natural é uma barreira para os exércitos invasores. Os defensores afegãos de qualquer idade somente tinham de esconder-se atrás dessa barreira natural e aguardar o momento mais oportuno para atacar os inimigos. Por outro lado, as montanhas do Hindu Kush têm possibilitado uma quase interminável guerra civil entre exércitos governamentais e forças oposicionistas – sejam elas liberais ou fundamentalistas, dependendo do momento –, assim como têm evitado a infiltração do Evangelho e de influências consideradas modernizantes, como o desenvolvimento tecnológico.
Os pataneses compõem o maior grupo étnico e constituem cerca de um terço da população. O segundo maior grupo, com cerca de 25 %da população do país, é formado de tadjiques, seguido por hazaras e uzbeques. Do total de 22,7 milhões de pessoas, 43 %possuem menos de 15 anos e 80 %da população vive em áreas rurais.
O Afeganistão já foi disputado por diversos impérios, desde Alexandre, o Grande, até o Império Britânico. Em tempos mais recentes, a autocracia monárquica deu lugar à República (1973), que por sua vez terminou com um golpe pró-marxista em 1978, seguido de uma invasão soviética. O conflito armado foi um desastre para o país e levou à retirada dos exércitos vermelhos no final da década de 80 e à queda do regime comunista em 1992.
A falta de união entre as fileiras guerrilheiras deu início a uma guerra civil e, ao longo da década de 90, uma milícia fundamentalista denominada Taleban obteve o controle de 95 %do país, deixando que apenas uma pequena área no norte fosse controlada pela inimiga Aliança do Norte.
Os ataques terroristas contra Nova York e Washington, no dia 11 de setembro de 2001, tiveram grandes conseqüências para a história contemporânea do Afeganistão. Após um breve período de investigações, o governo norte-americano concluiu que os atentados foram executados pela Al Qaeda, uma organização terrorista internacional liderada pelo saudita Osama Bin Laden, que vivia no Afeganistão na condição de hóspede do governo Taleban. Depois de inutilmente exigirem a prisão e a extradição de Bin Laden, os EUA declararam guerra contra o Taleban e, a partir do dia 7 de outubro, passaram a bombardear massivamente o território afegão, enfraquecendo a milícia fundamentalista.
Favorecida pela ajuda militar norte-americana e pelos ataques aéreos dos EUA e seus aliados, a Aliança do Norte conseguiu avançar rapidamente e dominar grande parte do território afegão, incluindo a capital Cabul, tomada em 13 de novembro. Outras forças anti-Taleban, como algumas tribos patanesas, também conquistaram territórios que se encontravam sob o domínio da milícia fundamentalista. No final de novembro de 2001, o Taleban já havia perdido o controle de praticamente todo o país, com exceção da cidade de Kandahar, onde a milícia mantinha seu quartel-general. Ainda assim, a queda da cidade era iminente.
Poucos países do mundo reconheceram o governo do Taleban, mas isto não impediu que, por alguns anos, seu regime fosse uma triste realidade para os afegãos. Na grande área que controlava, o Taleban impunha uma rígida interpretação da sharia, a lei muçulmana. Vários crimes eram punidos por meio de execuções, amputações e apedrejamentos públicos. As mulheres eram as que mais sofriam, pois não tinham acesso à educação nem à saúde, e seus direitos humanos eram constantemente desrespeitados. Além disso, diversas atividades corriqueiras eram proibidas, tais como o futebol, o cinema, raspar a barba e até tocar instrumentos musicais. O radicalismo do Taleban fez com que muitos intelectuais abandonassem o país.
No decorrer dos conflitos anteriores aos ataques norteamericanos, a economia afegã já havia sido arruinada por quase duas décadas de guerra. As áreas rurais haviam sido envenenadas, bombardeadas e minadas. Metade das habitações, quase a totalidade dos complexos sistemas de irrigação e grande parte dos rebanhos bovinos haviam sido destruídos. Com o advento do conflito com os EUA, as atividades econômicas do país tornaram-se ainda mais precárias. A agricultura absorve a maioria dos trabalhadores afegãos, sendo o cultivo de ópio a cultura mais rentável.
Cerca de 99 %da população é muçulmana e deste grupo 90 %são sunitas. Há algumas pequenas minorias religiosas, incluindo-se alguns poucos cristãos. Antes dos conflitos de 2001, a maioria dos cristãos eram estrangeiros, mas estes se viram obrigados a abandonar o país com o início dos ataques norte-americanos. Sob o domínio do Taleban, os xiitas foram sistematicamente perseguidos.
A IGREJA
O cristianismo chegou ao Afeganistão nos primeiros séculos da era cristã. Por volta de 400 d.C., já havia um bispo instalado na cidade de Herat. No entanto, o século XIV assistiu à erradicação do cristianismo por Timur e desde então a influência cristã tem experimentado períodos de ascensão e declínio. Durante a ocupação soviética, e também no período imediatamente posterior, era possível desenvolver algum tipo de ministério cristão, mas com a tomada do poder pelo Taleban todos os missionários cristãos e a maioria dos cidadãos ocidentais foram expulsos do país. Durante o governo Taleban, era permitido aos estrangeiros reunirem-se em pequenos grupos nos lares visando a confraternização, mas atos evangelísticos e a participação de afegãos eram proibidos. Os poucos afegãos convertidos ao cristianismo vivem sob constante medo e desconfiança de estranhos e de novos convertidos. A emigração e as mortes decorrentes da guerra e da violência são as principais razões do declínio da igreja do Afeganistão.
A PERSEGUIÇÃO
Enquanto manteve o poder, o Taleban instituiu um novo governo teocrático com base em uma rigorosa interpretação da sharia. A liberdade religiosa sofreu severas restrições como conseqüência das regulamentações impostas pelas diversas facções presentes no país. Quase todo o território afegão assistiu a uma vigorosa promoção do Islã, que resultou, de maneira geral, em uma opressão jamais vista contra a pequena comunidade cristã.
As leis e os costumes afegãos exigem uma filiação religiosa. O ateísmo é considerado apostasia, um crime passível de punição com a morte. Por princípio, todos os afegãos são considerados muçulmanos e as conversões são ilegais. Os convertidos podem ser condenados à morte por apostasia. Os não muçulmanos residentes no país podem praticar a sua fé, mas não podem evangelizar. Todos os homens muçulmanos devem participar das orações diárias nas mesquitas, enquanto as mulheres devem fazer suas orações em casa por não terem acesso aos templos, pelo menos enquanto o Taleban encontrava-se no poder. Alguns países, entre eles o Irã e a Arábia Saudita, têm apoiado o Afeganistão com o envio de líderes religiosos, dinheiro e literatura. O país é um verdadeiro lar para muitos muçulmanos radicais que ameaçam a vida dos cristãos. O norte do país é o principal fornecedor de ópio do mundo, e os produtores e distribuidores perseguem os cristãos que se opõem às suas atividades.
Em janeiro de 2001, o Taleban promulgou um decreto que condenava à morte qualquer pessoa que se convertesse ao cristianismo, que tentasse converter terceiros ou que distribuísse literatura cristã. Em maio do mesmo ano, uma nova lei obrigou os hindus a se vestirem de amarelo e colocarem bandeiras amarelas em suas casas para que ficassem isentos da aplicação das leis religiosas destinadas aos muçulmanos. O Taleban permitia que os hindus tivessem uma certa liberdade religiosa no Afeganistão, mas a milícia fundamentalista nunca reconheceu a existência de cristãos e judeus no país.
Durante o regime do Taleban, os cristãos afegãos viviam em permanente perigo, como nos mostra a história de Noor Khan. Certo dia, Noor recebeu uma intimação para apresentar-se em um escritório do governo. A razão para a convocação não lhe pareceu legítima, mas ele orou e a atendeu. Quando entrou no edifício, oficiais o agarraram e perguntaram se ele era Noor Khan, o homem suspeito de ser um cristão. Os afegãos costumam utilizar nomes diferentes de acordo com as circunstâncias, de tal forma que, embora algumas pessoas o conhecessem como Noor Khan, seu nome oficial era totalmente diferente. Assim, ele apresentou aos oficiais seus documentos com o nome real, dizendo-lhes que haviam cometido um engano.
Ainda assim, os oficiais o mantiveram sob maus tratos durante horas, acusando-o de ser cristão. Finalmente, eles desistiram e o trancafiaram, advertindo-o: "Espere até que os interrogadores de Kandahar cheguem aqui. Eles arrancarão a verdade de você." Tudo o que Noor Khan podia fazer naquela situação era orar e aguardar.
No dia seguinte, três homens chegaram e começaram a interrogá-lo. Para sua surpresa, ele reconheceu um deles como seu comandante no outrora exército do governo comunista. Seu coração quase parou quando ele percebeu que o homem certamente ia denunciá-lo. Ao invés disso, o visitante sinalizou-lhe para que ficasse quieto e não deixasse transparecer que eles já se conheciam. Mais tarde, quando ficaram a sós, o visitante explicou: "Se você não disser aos outros quem eu sou, eu não lhes direi quem você é e vou ajudá-lo a sair daqui."
Ele estava preocupado com sua própria segurança porque ex-comunistas eram freqüentemente executados ou condenados à prisão por crimes passados. Este antigo comandante comunista havia sido enviado pelo Comandante Celestial de Noor Khan para libertá-lo.
No dia 5 de agosto de 2001, 24 funcionários da Shelter Now, uma organização cristã de ajuda humanitária, foram detidos sob a acusação de pregar o cristianismo entre os muçulmanos afegãos. O fato ganhou destaque na mídia internacional porque faziam parte do grupo quatro alemães, dois australianos e duas norteamericanas. De acordo com as leis afegãs, os prisioneiros poderiam ser condenados à morte.
Com o início dos ataques aéreos norte-americanos ao território afegão, a situação dos 24 prisioneiros tornou-se ainda mais grave. Não foi permitido nenhum contato com 16 afegãos que, segundo o Taleban, seriam julgados separadamente. Os oito estrangeiros permaneceram detidos em Cabul até a retirada do Taleban da cidade, quando foram transferidos para Ghazni, a 80 quilômetros da capital. No dia 13 de novembro de 2001, um dia após deixarem Cabul, os oito estrangeiros foram libertados por forças da Aliança do Norte. Três dias depois, foram resgatados por helicópteros norte-americanos e levados ao Paquistão.
O FUTURO
Atualmente, a igreja no Afeganistão está em declínio devido às guerras e à perseguição. Por volta do ano 2050, sem uma significativa investida evangelística que provavelmente custaria a vida de muitos mártires, o Afeganistão continuará a ser um país de esmagadora maioria muçulmana. A perseguição e o crescimento da igreja neste século dependerão da redistribuição do poder no país após o fim do conflito com os EUA e a total derrota do Taleban. O processo de formação do governo pós-Taleban será crucial para a igreja no país.
MOTIVOS DE ORAÇÃO
1. Os futuros líderes do Afeganistão poderão manter um regime fundamentalista ou transformar o país em uma nação livre. Ore para que os futuros líderes afegãos, particularmente aqueles ligados à Aliança do Norte, reconheçam Jesus Cristo como seu Salvador pessoal e permitam a entrada de trabalhadores cristãos no país.
2. Organizações cristãs foram expulsas do país. Ore para que a nova conjuntura pós-Taleban permita que ministérios cristãos estrangeiros entrem no Afeganistão para servir ao povo afegão.
3. Muitos refugiados afegãos vivem no exterior. Estes refugiados muitas vezes são intelectuais mais liberais que discordam da severidade dos fundamentalistas e poderiam estar abertos ao cristianismo. Alguns deles, se convertidos, poderiam ser chamados pelo Senhor para retornar ao seu país natal, levando a mensagem do Evangelho para suas famílias.
4. Os cristãos afegãos mantêm sua fé em absoluto sigilo para evitar a perseguição e a morte. Ore para que recebam ousadia e sabedoria, o que lhes propiciaria a possibilidade de sobreviver e anunciar o Evangelho no ambiente extremamente hostil em que vivem.
5. As mulheres afegãs foram dramaticamente afetadas pelo Taleban. A rigorosa interpretação do código legal muçulmano negou às mulheres o acesso à educação, ao comércio e à assistência médica. Ore para que o novo governo que venha a ser formado no país estimule a igualdade entre homens e mulheres. Ore também para que surjam maneiras criativas de se exercer um ministério voltado às mulheres afegãs.
6. As crianças têm sido as grandes vítimas dos constantes conflitos. Muitas delas sofreram ferimentos graves ou morreram vítimas das minas instaladas pelos soviéticos, quando estes tentavam erradicar a guerrilha islâmica, conhecida por mujahedin. Ore para que organizações e ministérios de ajuda humanitária encontrem meios de levar o amor de Cristo a essas crianças.
7. As conquistas militares da Aliança do Norte foram marcadas pelo desrespeito aos direitos humanos. Segundo denúncias da imprensa internacional e da ONU, os combatentes da Aliança do Norte cometeram massacres, execuções e atrocidades enquanto avançavam e conquistavam territórios sob o domínio do Taleban. Ore para que o governo pós-Taleban consiga erradicar o ódio e pacificar o país.
ESTATÍSTICA
CapitalCabul
População22,7 milhões (20 %urbana)
Área652.225 km2
LocalizaçãoCentro-sul da Ásia, sem saída para o mar.
IdiomasDari, patanes, uzbeque e turcomano
ReligiãoIslamismo 99,4%,cristianismo 0,01 %
População Cristã2.500, fatia da população em declínio
PerseguiçãoSevera, intensificandose rapidamente
RestriçõesEvangelização, igrejas e cultos cristãos são proibidos. A conversão de muçulmanos não é permitida. Cristãos podem ser condenados à morte.
No século XXI...A intensidade da perseguição dependerá da redistribuição de poder após o final do conflito dos EUA e seus aliados contra a milícia Taleban.
Fonte base do texto:
Livro Cristianismo de alto risco (São Paulo, Carrenho Editorial, 2002)
Fonte base do mapa:
Globalis (em inglês)
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